sábado, 4 de maio de 2019

Carta Pastoral ao 127º Concílio Diocesano


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Carta Pastoral ao 127º Concílio da Diocese Meridional da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil – Paróquia da Ressurreição  – 03-05 de maio de 2019
Tema: "IGREJA: VIDA E COMPAIXÃO”  
Lema: “Disse-lhe Jesus: Dá-me de beber” (João 4.7b) 

Queridas irmãs e irmãos em Cristo, 
Graça e Paz da parte de Deus, Nosso Pai Materno, e de Nosso Senhor Jesus Cristo: 

1.O tema e lema deste 127º Concílio da Diocese Meridional convidam a ser igreja com a perspectiva de Jesus compassivo. Compassivo porque olha com amor para aquelas pessoas vivem sob o peço da discriminação e do preconceito. Se lermos o final da passagem de onde extraímos o lema deste Concílio, isso fica claro na reação dos discípulos homens diante do diálogo entre Jesus e a mulher: “E nisto vieram os seus discípulos, e maravilharam-se de que estivesse falando com uma mulher; todavia nenhum lhe disse: Que perguntas? ou: Por que falas com ela?” (João 4.27). Jesus interfere na realidade da mulher samaritana e no pensamento preconceituoso de seus seguidores. Em outra passagem do mesmo Evangelho os religiosos conservadores de Jerusalém o acusam dizendo: “Não dizemos nós bem que és samaritano, e que tens demônio?” (João 8.48). Assumir esta passagem do Evangelho segundo São João como tema e lema deste Concílio é nos colocar no lugar da samaritana! Queremos ser uma Igreja de Vida e Compaixão? Queremos realmente ser a Igreja de Mulher Samaritana?  

2.Jesus inicia a conversa à beira d e um poço que era uma referência importante para a fé do povo samaritano. Ali encontra uma mulher que ia meio dia tirar água para não ser vista e censurada. É ele que toma a inciativa, dizendo: “Dá-me de beber” (4.7b). Estaria Jesus sendo compassivo ou testando a sua “superioridade” ao “mandar” a samaritana lhe dar água? Jesus esperaria que a mulher, “calada” e “submissa”, apenas retirasse água lhe desse? A compaixão – como impulso de ternura para com a pessoa que sofre – fica clara quando a mulher o questiona: “Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana?”. Como reagiria Jesus se, como esclarece o Evangelho, “os judeus não se comunicam com os samaritanos” (João 4:9)?  Reage com compaixão superação os preconceitos - o ódio de gênero, o desprezo étnico e religioso – e abrindo uma nova perspectiva de vida: “Se tu conheceras o dom de Deus, e quem é o que te diz: ‘Dá-me de beber’, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva” (João 4.10). Compaixão e vida derrubam esse muro que excluía a mulher (por ser mulher e samaritana)! Jesus a trata sem distinção, sem julgamento, sem categorização. Ela tem direito a essa água vivificadora. Queremos ser essa Igreja da Mulher Samaritana, onde se vivem em relação de compaixão e vida com quem sofre a discriminação, o preconceito, a exclusão, a violência e a injustiça? 
3.As igrejas nem sempre fizeram o que fez Jesus. Muitas vezes agiram – e agem - como aqueles religiosos conservadores de Jerusalém: rejeitando pessoas, desconsiderando-as, e acusando-as de 
“endemoniadas” ou “doentes”. Ou, ao exemplo dos seguidores de Jesus, se omitem por medo a perguntar, “por que”?  A Igreja Episcopal Anglicana do Brasil tem se assentado à beira do Poço quando se permite agir compassivamente diante da luta aguerrida das mulheres por dignidade, justiça, contra a violência de gênero; quando se soma ao apelo de acessibilidade e cidadania das pessoas com deficiência, quando se faz presença amorosa, compassiva e desafiadora junto as pessoas LGBTI+, quando denuncia o genocídio do povo negro e indígena e todas as formas de racismo,  quando se opõe a  um sistema econômico, político e social construído - desde o Brasil colônia - sob a base da escravidão, do extermínio, da exploração das pessoas e da destruição da natureza. É isso que faz que nossa fé interior em Jesus se traduza em compaixão e vida, não apenas para as pessoas próximas e parecidas a nós que já estão na Igreja, mas em relação a todas as pessoas, muitas das quais antes não tinham nem coragem de entrar numa igreja. Quantas mulheres samaritanas ainda esperam se encontrar com Jesus através de nossa igreja? Onde está nosso Poço de Jacó? 

4.O caminho do Poço de Jacó, dos diálogos com a mulher samaritana, pode gerar reações contrárias, desrespeitosas, odientas. Podem nos chamar, entre outras coisas, de igreja “endemoniada”, como fizeram os religiosos conservadores com Jesus. Mas isso não impediu Jesus, e não impedirá de seguir aprendendo com as vozes e as vidas de quem antes vivia o silêncio forçado. Nada disso fez com que Cristo deixa-se de oferecer “água viva”! Da mesma forma vejo essa água começar a brotar entre nós. 
Vejo um renovado entusiasmo em assumir a identidade anglicana por pessoas jovens e adultas, com 43 pessoas confirmadas e recebidas neste ano. Vejo água viva na solidariedade que, conforme o relatório parcial levantado pela nossa Secretária de Ação Social, mais de 1600 pessoas estão sendo atendidas por projetos sociais (nossos ou em parceria). Vejo água viva em novas iniciativas de compromisso com a ecologia, com a saúde integral, com a economia solidária, com a cultura surda, com a qualidade de vida de pessoas com deficiência, com o amparo a pessoas em situação de rua. Vejo água viva em nossa formação teológica e pastoral, como diocese e como área provincial, buscando nos capacitar para um diálogo mais qualificado com a sociedade e todos os desafios que nos apresenta. Vejo água viva nos movimentos que mantém e renovam nossa fé pessoal, como o Cursilho de Cristandade e o Mutirão de Avivamento. Vejo água viva em novos espaços de diálogo como o da Pastoral da Diversidade n Catedral e do Projeto “Abraço Negro” - formulado pela nossa nova clériga, Revda. Dra. Lílian Conceição. Vejo água viva nos projetos da Oferta Unida de Gratidão. Vejo também água viva no plano de sustentabilidade do Lar, acompanhado pelo Conselho Diocesano (com muita intensidade e comprometimento). Vejo água viva nos encontros de formação administrativa e financeira. Vejo água viva na parceria com Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos que, além de nos apoiar no Estudo da Bíblia, assumiu, este ano, parte de nossa Ação entre Amigos. Vejo água viva nos grupos de teatro, música, canto, nas caminhadas ecológicas, projetos formação em Direitos Humanos da UJAB, nas novas iniciativas da UMEAB, no Plano Estratégico Diocesano e na Política Diocesana de Comunicação - que junto ao Devocionário Sementes - buscam nos unir cada vez mais numa ação e numa espiritualidade missionária e transformadora. Certamente, ainda poderemos ver muito mais, porque há mais do aqui foi mencionado. Estamos sendo uma Igreja de Vida e Compaixão, mas ainda podemos ser mais e melhor.  

6.Para sermos esta Igreja da Mulher Samaritana, Igreja de Vida e Compaixão, Igreja que leva a Jesus fonte de água viva, teremos que continuar a assumir o nosso lugar junto ao poço. Temos que nos dispor cada vez mais a participar de diálogos abertos, francos, construtivos e empoderadores. Temos que cada vez nos ver na perspectiva da mulher samaritana. Temos cada vez mais que descobrir em Jesus o acesso a água viva para todas as pessoas! Teremos que assumir em nossos planejamentos comunitários o que já está formulado na Missão que será apresentada no Plano Estratégico 
Diocesano:  “Proclamar o Evangelho de Jesus Cristo, promovendo a dignidade humana de forma acolhedora, inclusiva, profética e solidária”. Teremos que nos lembrar em nossa ação cotidiana como comunidades de fé, da Visão de “Ser uma Igreja Diocesana dinâmica, segura, sustentável, que vive a Missão de Deus”. Agora temos o desafio de - como fez a mulher samaritana após encontrar a fonte de água viva - nos transformar em agentes de superação do medo, do ódio e da exclusão. Precisamos deixar Jesus agir em nós. Precisamos nos permitir sentir a comunhão na união de nossas mãos que dão e recebem. Precisamos buscar com Jesus a alegria de cada encontro e o prazer de cada abraço. Precisamos viver com Jesus a coragem e a generosidade da partilha do que somos e do que temos (sempre em gratidão pelas inúmeras bênçãos recebidas). Estamos fazendo isto? Que bom porque Jesus está em nós, e o Espírito Santo de Deus, a Ruáh Divina, nos anima. Continuemos, ampliemos, incluamos! 

7. Uma Igreja de Vida e Compaixão, que dá de beber da fonte da água da vida, é uma Igreja libertada e liberadora, transformada e transformadora, comprometida e comprometedora, que se descobre em cada pessoa e que cada pessoa descobre dentro de si, sendo parte dela como instrumento divino.  Não estamos dizendo que o desafio de ser esta Igreja seja fácil, nem simples. Mas, é Jesus que vem ao nosso encontro e nos diz, mais uma vez: “Dá-me de beber”. Ele está aí, Ele me/te/nos conhece completamente e nos acolhe e ama incondicionalmente. Por isso é que podemos dizer “sim” ao chamado ministerial que Jesus faz a toda pessoa batizada! Por isso é que podemos sair, podemos vencer nossos medos e  podemos contar para outras pessoas o que vivenciamos nesta igreja. Que Deus, Nosso Pai Materno, presente na beleza deste universo infinito e deste planeta abençoado. Que Deus, Jesus Cristo, Palavra feita gente entre a gente, presente no rosto de cada pessoa, em especial daquelas mais pobres e vulneráveis. Que Deus Espírito Santo, Divina Ruáh, Ventania da Vida e da Missão, esteja em cada pessoa, em todo lugar, intervindo em toda realidade, e gerando entre nós um mundo melhor. Amém.  

+ Humberto Maiztegui Gonçalves - Bispo Diocesano